Jogo das sombras
Lembro de ver nosso abraço projetado naquela parede. Suas mãos embalando meu corpo e minha alma. As mesmas mãos que mais tarde esquartejariam o meu coração.

Vi naquela parede
A sombra da incisão de meu próprio ser
Um espectro cor-luto opaco e quase sólido
De mãos que se confundiam
umas com punhais
outras borrifando rios de sangue
Disputa injusta,
As sombras, embora traiçoeiras,
não mentem, só dramatizam
Foi quando uma das mãos
Desprendeu-se do punhal
E ergueu algo que pulsava,
Em compassos, cada vez mais lentos
Ecoando sileciosamente: um coração,
que pendia gélido e agora inerte
naquelas mãos forasteiras
Um demasiado vazio.
Turvou-me os olhos a dor
Lavei-os com lágrimas em vão
e caí de joelhos esperançoso,
tateando as paredes.
Tarde de mais.
As sombras não podem ser tocadas.
Nem mais o ar,
nem mesmo a luz.
e ali no chão,
despido da existência
alguém que sentiu sede
de si mesmo.